Nasci na Ucrânia, terra de meus
pais. Nasci numa aldeia chamada Tchechelnik, que não figura no mapa de tão
pequena e insignificante. Quando minha mãe estava grávida de mim, meus pais já
estavam se encaminhando para os Estados Unidos ou Brasil, ainda não haviam
decidido: pararam em Tchechelnik para eu nascer, e prosseguiram viagem. Cheguei
ao Brasil com apenas dois meses de idade. (apud. MOSER, 2011. Clarice
Lispector, “Esclarecimentos – Explicação de uma vez por todas”, in A descoberta
do mundo, op. cit., p. 345, grifo no original)
Criei-me em Recife, e acho que
viver no Nordeste ou Norte do Brasil é viver mais intensamente e de perto a
verdadeira vida brasileira [...] Minhas crendices foram aprendidas em
Pernambuco, as comidas que mais gosto são pernambucanas.
(apud. MOSER, 2011. Clarice
Lispector, “Esclarecimentos – Explicação de uma vez por todas”, in A descoberta
do mundo, p. 345)
Em 1977 Clarice Lispector
deu sua última entrevista na televisão. No programa Panorama, ela pediu que
divulgassem a entrevista apenas após a sua morte, e assim foi feito.
A escritora nasceu em
Tchetchelnik, uma aldeia pequena da Ucrânia. Chegou ao Brasil em 1920 com dois
meses de idade. Ela e sua família moraram por dois meses em Maceió e depois em
Recife. Todos ganharam nomes brasileiros. “O nome que ela recebeu em Tchetchelnik,
Chaya, que em hebraico significa ‘vida’ – e que também tem a apropriada
conotação de ‘animal’ – desaparecia, reaparecendo apenas em hebraico em sua
lápide tumular, e mantendo-se pouco conhecida no Brasil até décadas depois de sua
morte.” (MOSER, 2011, p. 65)
Na entrevista à TV
Cultura, Clarice disse que assim que começou a ler ela também começou a
escrever pequenas histórias. Contou que sua produção na época da adolescência
era caótica, intensa e fora da realidade da vida. Comentou que escreveu muitos
contos para revistas e jornais antes de publicar seu primeiro livro. Ela contou
ainda que pedia para as revistas publicarem seus contos.
Eu sou
tímida e ousada ao mesmo tempo. Chegava lá nas revistas e dizia: “Eu tenho um
conto, você não quer publicar?”. Aí me lembro que uma vez foi o Raymundo
Magalhães Jr. que olhou, leu um pedaço, olhou para mim e disse: “Você copiou
isso de quem?”. Eu disse: “De ninguém, é meu”. Ele disse: “Então vou publicar”.
(apud. MOSER, 2011. Julio
Lerner, “Última entrevista de Clarice Lispector”, op. cit.)
“A moça loura, ‘alta,
pensativa, rebelde’, com seu sotaque estranho e notável histórico escolar,
causava forte impressão. [...] Estava experimentando seus primeiros passos como
escritora em segredo, criando sua máscara como ela própria definiu, e com muita
dor.” (MOSER, 2011, p. 165)
Em fevereiro de 1939,
Clarice prestou vestibular alcançando o primeiro lugar no curso preparatório e
o quarto entre os 300 candidatos de todo o país.
Escreveu seu primeiro
livro Perto do Coração Selvagem aos
23 anos. Seu segundo livro O Lustre foi
publicado no Brasil em 1946. Na entrevista concedida à TV Cultura, após ser
questionada sobre em que momento ela decide assumir a carreira de escritora,
Clarice afirma que nunca assumiu porque não se considera uma profissional.
“Quando Clarice começou a escrever, em março de 1942, ainda estava na faculdade
de direito e trabalhava como jornalista. Em fevereiro tinha se transferido para
o jornal A Noite, que já fora uma das
glórias do jornalismo brasileiro. A redação dividia um andar com Vamos Ler!, revista literária popular
onde ela publicara alguns de seus primeiros contos.” (MOSER, 2011, p. 221)
Em 1961 publicou A maça no escuro, três anos depois A paixão segundo G.H., um dos seus textos
mais tensos.
A
Paixão segundo G. H. o colocou entre os maiores romances do século. Pouco tempo
antes de morrer, em sua última visita ao Recife, Clarice disse numa entrevista
que, de todos os seus livros, esse era o que ‘correspondia melhor à sua exigência
como escritora’. (apud.
MOSER, 2011. Cf. Nádia Battella Gotlib, Clarice, uma vida que se conta, op.
cit., p. 480)
Clarice diz que não se
considera uma escritora popular, pois algumas pessoas a chamam de hermética. No
entanto, diz que não se vê dessa maneira, já que ela se compreende. Entre todos
os seus trabalhos, Clarice diz que os que ela vê com maior carinho são: O ovo e a galinha – é um mistério para
ela – e Mineirinho, o qual ela
escreve sobre um bandido.
Na época desta entrevista,
Clarice estava escrevendo seu último livro, A
Hora da Estrela. “Em outubro, apenas alguns dias depois da publicação de A Hora da Estrela, Clarice Lispector foi
subitamente hospitalizada. No táxi a caminho do hospital, ela disse: ‘Faz de
conta que a gente não está indo para o hospital, que eu não estou doente e que
nós estamos indo para Paris’, lembrava-se Olga Borelli. (MOSER, 2011, p. 646)
De acordo com Moser, Clarice tinha dito que “cada um escolhe o modo de morrer”,
e o meio que ela escolheu foi macabramente apropriado. “Depois de uma vida
inteira escrevendo sobre ovos e o mistério do nascimento – em A Hora da Estrela ela se refere com
insistência aos ovários secos de Macabéa -, ela própria sofria agora de um
incurável câncer no ovário.” (MOSER, 2011, p. 647)
Clarice Lispector foi
sepultada no cemitério israelita do Caju, não muito longe do porto onde Macabéa
passava suas raras horas vagas, no dia 11 de dezembro de 1977. Na lápide,
gravado em hebraico o nome oculto: Chaya bat Pinkhas. Chaya, filha de Pinkhas.
Bibliografia
MOSER, Benjamin. Clarice, uma biografia. São Paulo:
Cosacnaify, 2011.